Grupo do Rio Grande do Norte encerra o FILO 2023 com “Abrazo”, inspirado na obra de Eduardo Galeano. Apresentações acontecem sábado e domingo, no Teatro Ouro Verde

O espetáculo “Abrazo”, do grupo potiguar Clowns de Shakespeare, encerra o FILO 2023 com duas apresentações neste sábado (1) e domingo (2), às 20h30, no Cine Teatro Ouro Verde. Nesta fábula sem palavras, personagens atravessam um quadrado, um pequeno território, contando histórias de encontros, despedidas, opressão, exílio e também de afeto e liberdade. É um lugar cheio de regras, onde não é permitido abraçar.

Com ênfase no público infanto-juvenil, o espetáculo tem trilha sonora original e vídeo de animação que compõem esta aventura por um pequeno país, onde quase tudo é proibido. 

O grupo Clowns de Shakespeare, fundado há 30 anos no Rio Grande do Norte, inspira-se livremente na obra do escritor uruguaio Eduardo Galeano – principalmente em O livro dos abraços -, para criar esse espetáculo não verbal que propõe a crianças e adultos uma reflexão sobre temas complexos, como ditadura, guerras e proibições. 

A equipe de comunicação do FILO conversou com Fernando Yamamoto, diretor e dramaturgo do Clowns de Shakespeare, que ressaltou a força do simbolismo de um grupo de teatro nordestino encerrar a edição 2023 do Festival – principalmente tendo em vista esse momento de reconstrução do país e retomada cultural que estamos vivendo. Eis o abraço final. 

Confira a entrevista completa:

Como surgiu a ideia de montar “Abrazo”? 

O espetáculo tem quase 10 anos de existência, e faz parte da trilogia latino-americana do Clowns de Shakespeare, que é o momento em que o grupo começa a investigar essa questão da América Latina. E isso se deu através de uma trilogia: “Abrazo”, “Nuestra senhora de las nuvens” e “Dois amores e um bicho” – estes últimos, dois espetáculos adultos que não estão mais no repertório do grupo. A trilogia surge em 2014, na ocasião dos 50 anos do Golpe Civil e Militar de 1964. Era um desejo do grupo de, naquele momento, falar sobre essas questões, tanto para o público adulto quanto para o infantil, para que a memória se mantivesse viva e para que isso não voltasse a acontecer. Mal sabíamos que alguns anos depois passaríamos por um processo análogo em muitos sentidos… Para a história do “Abrazo”, toda essa trajetória foi determinante. O espetáculo ganhou outras facetas e outras nuances ao longo desses nove anos – com o golpe de 2016, com a eleição de Bolsonaro e os quatro anos de trevas que vivemos no país. E agora ganha distintos significados, se relacionando com o público de forma diferente e tendo diferentes respostas em cada momento histórico dessa última década. O panorama político e cultural do Brasil vem interferindo na forma de recepção do espetáculo ao longo do tempo. 

O espetáculo parte do Livro dos abraços, de Eduardo Galeano. Como essa obra alimentou o processo criativo de vocês?

Não só esse livro, mas outros do Galeano, serviram muito mais como uma inspiração. O elenco partia do processo de criação inspirado a cada dia por um conto, primeiramente do Livro dos abraços e depois de outras obras. 

Em 2019, houve um episódio de censura em Recife, quando “Abrazo” foi cancelado pouco antes da apresentação. É quase uma ironia que um espetáculo que fala de temas como ditadura, guerras e proibições tenha passado por isso. Pode comentar o episódio? 

Simbolicamente, no dia 7 de setembro de 2019, passamos por esse episódio que, com certeza, é o mais triste e o mais violento da história do grupo, quando fomos censurados e impedidos de trabalhar na Caixa Cultural de Recife. Esse episódio segue na justiça – em um processo que nós entramos e em outro que o Ministério Público entrou contra a Caixa. E não é por acaso que isso aconteceu com “Abrazo”, pela temática que trata… por mais que seja um espetáculo muito poético, metafórico e singelo, são temas pesados. 

“Abrazo” tem classificação livre e ênfase no público infanto-juvenil. Você acredita que tocar em temas difíceis com a nova geração tem um potencial transformador? 

A gente entende que é fundamental que todas as questões sejam tratadas com o público infanto-juvenil, por mais que, obviamente, existam formas distintas de tratar de acordo com cada perfil de público. Ao longo desses nove anos, a resposta tem sido muito bonita – inclusive do público infantil de distintas idades. É um espetáculo que propõe um debate sobre coisas que devem ser depois desenvolvidas com as crianças pelos pais e pela escola. 

O grupo Clowns de Shakespeare completa 30 anos de história neste ano. Como vocês avaliam estar no FILO 2023, um dos festivais de teatro mais antigos da América Latina, com dois trabalhos?

Estamos muito felizes de voltar a Londrina! Já faz mais de uma década que estivemos no FILO e todo mundo sabe de que se trata de um dos principais festivais de teatro do país, que tem uma importância muito grande na forma de pensar o desenvolvimento da linguagem do teatro no país, nas suas ações formativas… nesse sentido, agora chegando aos 30 anos do grupo, está sendo muito bonito esse momento que estamos passando, de revisitar festivais que foram muito importantes na nossa história. E, com certeza, o FILO está entre eles! Pra gente, é uma alegria não só estar no FILO, mas estar no FILO com duas obras [“Ubu” e “Abrazo”] nesse momento. Estamos bastante ansiosos para encontrar com o público.

Quais são as ressonâncias que o público vai encontrar em “Ubu” e “Abrazo”? Existem aproximações ou são obras bem independentes?

Sem dúvida, os espetáculos têm espaços de diálogo. “Abrazo” está num momento em que o grupo começa uma investigação no universo latino-americano, enquanto um desejo de pesquisa. E “Ubu”, que é o nosso espetáculo mais recente, já está num lugar de mais maturidade de uma mesma pesquisa. Será um retrato interessante para o público de Londrina, que verá a principal pesquisa do grupo, a América Latina, nas duas pontas – quando estava começando e agora. De alguma forma, estamos tratando dos mesmos temas, das mesmas questões, a partir de momentos distintos do grupo.

“Abrazo” fecha a programação do FILO 2023. O que o público pode esperar? Que efeito vocês pretendem causar e que mensagem costuma continuar ecoando depois do fim?

“Abrazo” simboliza o processo que temos passado no país, tendo em vista a censura que o espetáculo sofreu…. agora a gente tem o privilégio de encerrar a programação do FILO nessa retomada, nessa força! É bonito fechar o Festival com “Abrazo”! Tem um outro aspecto que, para nós, é muito simbólico e significativo: o FILO ter sido aberto por um grupo nordestino,  o Magiluth, e fechado por nós, mostrando a força do teatro de grupo do Nordeste. A retomada nacional e de reconstrução que todos nós estamos vivendo passa pelo reconhecimento da importância da região Nordeste nesse processo. Vai ser muito simbólico encerrar o Festival com “Abrazo”. 

 

Layse Barnabé de Moraes
Assessoria de Comunicação FILO

 

Foto/divulgação: Rafael Telles


Ficha Técnica

Direção: Marco França.
Elenco: Camille Carvalho, Dudu Galvão E Paula Queiroz.
Roteiro: César Ferrario.
Dramaturgia: O Grupo.
Música Original, Arranjos e Direção Musical: Marco França.
Músicos Convidados: Simone Mazzer, Roberto Taufic, Júnior Primata, Samir Tari, Zé Hilton e Vitor Queiroz.
Desenho De Som: Fernando Suassuna.
Preparação Corporal: Anádria Rassyne.
Figurino: João Marcelino.
Adereços: João Marcelino, Nando Galdino e Janielson Silva.
Iluminação: Ronaldo Costa.
Operação de Luz: Rogério Ferraz.
Cenografia: O Grupo.
Ilustrações: José Veríssimo.
Animações: Paula Vanina.
Técnico de Vídeo: Rafael Telles.
Produção: Rafael Telles.

Classificação indicativa: Livre

Duração: 60min

“Abrazo”
Clowns de Shakespeare (Natal – RN)
Data: 1 e 2  de julho
Horário: 20h30
Local: Cine Teatro Ouro Verde (R. Maranhão, 85)

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