Espetáculos do FILO 2022 tiveram intérpretes de LIBRAS em todas as apresentações com falas, ampliando a acessibilidade à comunidade surda
Praticamente uma apresentação à parte, o trabalho dos tradutores e intérpretes da Língua Brasileira de Sinais (LIBRAS) durante o Festival Internacional de Londrina – FILO 2022 contribuiu para ampliar a acessibilidade da comunidade surda de Londrina.
Além de dominar a LIBRAS, o trabalho exige conhecimento da cultura surda e também habilidade de expressões faciais, corporais e gestos que ajudem a pessoa surda a compreender a mensagem que está sendo transmitida.
“Esta foi a primeira edição em que tivemos os intérpretes em todos os espetáculos com falas. Acredito que é um passo que não dá para voltar atrás. Precisamos manter a garantia desse direito”, afirma o coordenador geral do FILO, Alexandre Simioni.
Filho de pais surdos, o bacharel em História com pós-graduação em Educação para Surdos, Lucas Grigio da Silva, 26 anos, que é ouvinte, é proprietário da empresa londrinense que disponibilizou a equipe de intérpretes para atender à demanda do festival. “Ao todo, tivemos seis pessoas participando desse trabalho, que é diferente por se tratar de algo cultural, da arte teatral”, comenta Silva.
Devido à especificidade desse trabalho, o intérprete escalado tem, em média, três dias de antecedência para estudar o roteiro da peça, tirar suas dúvidas com os atores e até mesmo acompanhar o ensaio da montagem. “Tomamos esse cuidado na preparação para reduzir ao máximo a margem de erros durante a interpretação. Precisamos lembrar que a construção das frases em português é linear, enquanto que em LIBRAS é tópico-visual e depende de sinais e expressões”, explica. A equipe que trabalhou no festival foi composta por Silva, Gabriela Inácio, Helora Carloto, Paulo Henrique Lima, Yara Freitas e Juliana Moralles (responsável pelo cerimonial).
De acordo com o Perfil das Pessoas com Deficiência realizado em 2013 atualizado em 23 de setembro de 2020 – estima-se que a comunidade surda em Londrina esteja em torno de 13 mil pessoas que, de modo geral, não contam com o recurso de acessibilidade na grande maioria dos eventos culturais realizados na cidade. “É tão raro isso que os surdos acabam não frequentando esses eventos. Eu mesmo, quando criança, não ia ao teatro porque os meus pais não entendiam o que estava sendo apresentado e acabavam não me levando também”, relata.
“A acessibilidade é algo que precisa ser naturalizado, fazer parte da nossa rotina, independentemente de ter ou não surdos na plateia. É um direito que deve ser garantido, caso algum espectador surdo decida participar. E quanto mais eventos com acessibilidade, mais haverá a formação de público de pessoas surdas. Aliás, acho que todos os telejornais locais deveriam ter acessibilidade para surdos”, avalia.
No espetáculo “Esperando Beltrano”, do Centro Teatral Etc e Tal (Rio de Janeiro), apresentado durante dois dias no Ouro Verde, um grupo de surdos esteve na plateia. “Acredito que o fato da montagem destacar o trabalho de mímica acabou por chamar a atenção dessas pessoas surdas, que se interessaram em ir”, observa Silva, que reforçou nas suas redes de contato que a programação do FILO deste ano contava com acessibilidade.
O estudante de LIBRAS e funcionário do Departamento de Tecnologia e Informática da Secretaria Municipal de Saúde, Carlos Eduardo Franzini da Silva, 51 anos, fez parte do grupo que foi assistir à montagem de “Esperando Beltrano”, junto com a esposa, e gostou do que viu: “Com o trabalho dos intérpretes, conseguimos entender muito bem a fala dos atores e gostamos do estilo de humor, do visual e gestual deles. Foi muito divertido e a acessibilidade 100% é fundamental para nós”, ressaltou. A professora de LIBRAS e aposentada Maria Cristina Lopes, 56 anos, também integrou o grupo de surdos que foi ao espetáculo e aprovou a iniciativa. “Os atores são muito engraçados e foi maravilhoso contar com o recurso da acessibilidade. Deveria ter sempre”, sugere.
Ana Paula Nascimento / Assessoria FILO